fui ouvir Mussorgsky e Tchaikovsky à Gulbenkian. Uma noite no monte
calvo e Canções e danças da
morte (versões orquestradas), do primeiro; O lago dos Cisnes,
do segundo. clássicos dos clássicos, trevas sonoras
sucedidas de ventos primaveris. não em jeito de desfaçatez, passei
o tempo todo a olhar para os sapatos dos senhores e senhoras da orquestra - talvez uma infantilidade, mas não desfaçatez. e neste
acto genuíno de contemplação, dei comigo a entrar num profundo enlevo com os
movimentos dos pés de quem doma os instrumentos. cada um tinha posições
diferentes, uma forma de se equilibrar única. percebi então que a música está
muito “agarrada ao chão”, que os pés são um sensor de estímulos - a nota sai
mais assim ou assado se o pé tomar esta ou aquela
posição... pronto, já estou a exagerar, claro, e além disso não percebo nada de
música. mas a verdade é que esta noite tudo me soou mais cavernoso, mais denso,
como a terra a tremer. desmistificando um pouco: estava sentada na primeira fila.
no final,
quando subi os olhos ao céu, que é como quem diz, ao nível dos instrumentos, vi
a corda solta de um dos violinos, a bailar na luz quente do palco, enquanto se
lhe pedia um último labor para o tchanaaam. nisto, pensei apenas, “uau, a terra tremeu
mesmo”. aplausos.
Das Schiff der verlorenen Menschen, Maurice Tourneur (1929)
Sem comentários:
Enviar um comentário