quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Strange Impersonation

Há muito tempo que não ia a uma matinée na Cinemateca. Não me peçam para explicar o que é muito tempo. O meu calendário emocional diz-me que passou uma grande temporada e eu só posso confirmar. Hoje lá cheguei, sozinha, levantei o bilhete e sentei-me a ler antes da sessão. Ali perto estavam as mesmas cabeças grisalhas de sempre e outros desconhecidos navegantes, que também aguardavam serenamente o culto, uns a ler o jornal e outros a dormitar. Pensei cá para mim, as saudades que eu tinha disto. Atravessou-me uma deliciosa sensação de estar contracorrente. Imaginei todas as pessoas que naquela altura, em início de tarde, estavam fechadas num escritório entre papelada e barulho. Senti-me de repente mais nova, no coração daquele outro tempo em que passava dias inteiros na Cinemateca, com comida dentro da mala e uns livros para acompanhar o café entre as sessões… Não sei dizer o quanto fui feliz neste desrespeito pelo horário laboral dos outros, e não quero maçar ninguém com sentimentalismos. Mas curioso é que, no filme, um noir  Strange Impersonation, de Anthony Mann  a protagonista toma outra identidade. Sem forçar o paralelismo: também eu saí da minha pele por umas horas, e foi reconfortante. 

Strange Impersonation (1946), Anthony Mann





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