sexta-feira, 23 de abril de 2010

baloiço


sentada no baloiço, permanece num estado letárgico cujo chamamento da realidade não derruba. umas mãos tocam alternadamente as suas costas para impulsionar o movimento pendular em que o seu corpo, suspenso, se deixa levar. o vento bate na cara, levanta as saias e, no entanto, esse vento atrevido parece ser o único toque que lhe agrada. entra pelos interstícios da pele e, passando a fronteira física, parece tocar-lhe a alma.
o baloiço continua a baloiçar, o vento a circular. nisto surge a vertigem de uma iminente queda. a queda não se dá, porque uns braços surgem na urgência do amparo deste corpo adormecido na dor.
olhando o baloiço vazio, vê-se a aura que lá permanece. então ela volta e ocupa o seu lugar. ela volta e quer de novo baloiçar, porque o vento que lhe chega à alma é melhor conselheiro que as palavras de consolo que a rodeiam. o silêncio daquele momento envolve-a num abraço consolador.
o baloiço parou. os seus cabelos, rasgados pelo vento, formam um penteado quase poético que combina com o seu estado de alma ascético.

ela gosta daquele baloiço, simplesmente porque não toca com os pés no chão.
Fotografia de Julia Margaret Cameron

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