quinta-feira, 17 de julho de 2014

uma ida ao cinema

«- Leva-me ao cinema, não leva? – murmurou quase para si própria.
            Eikichi e eu, conduzidos parte do caminho por um homem de Koshuya de aparência duvidosa, fomos a uma estalagem que, segundo se dizia, pertencia a um ex-prefeito. Tomámos banho juntos e almoçámos peixe fresco do mar.
              Quando ele partiu, entreguei-lhe uns trocos:
   - Compra algumas flores para as exéquias de amanhã.
            Tinha explicado que deveria regressar a Tóquio no barco da manhã. Estava com falta de dinheiro, embora lhes tivesse dito que devia regressar à escola.
           - Bem, de qualquer maneira, vê-lo-emos este Inverno – afirmou a mulher mais velha. – Iremos buscá-lo ao barco – prosseguiu. – Avise-nos, quando vier. Ficará connosco (...).
           Quando os outros deixaram o quarto, pedi a Chiyoko e a Yuriko que viessem comigo ao cinema. Chiyoko, inclinada, pálida e cansada, pressionava com as mãos o abdómen.
              Yuriko olhou fixamente para o chão.
              A pequena dançarina estava lá em baixo a brincar com as crianças da estalagem. Assim que me viu descer, escapou-se e pôs-se a bajular a mulher mais velha para que a deixasse ir ao cinema. Regressou, distante e abalada.
(...)
Ao deixar a estalagem, a dançarina acariciava, sentada à entrada, um cão. Não consegui aproximar-me dela, e ela parecia não ter força para erguer os olhos.
Fui ao cinema sozinho. Uma mulher lia o diálogo com uma pequena lanterna eléctrica. Abandonei o lugar, quase imediatamente, e regressei à minha estalagem. Deixei-me ficar, por muito tempo, sentado, olhando para fora, com os cotovelos no peitoral da janela. A cidade estava escura. Julguei ouvir um tambor à distância, e sem razão especial dei comigo a chorar.»


Yasunari Kawabata,  A Dançarina de Izu



(Hijosen no onna, Yasujiro Ozu)

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