muitas vezes, ao abrir uma janela
ou uma porta, penso que terá sido este o gesto primordial da invenção das artes
do enquadramento, como seja a pintura, a fotografia e o cinema. aquilo que vejo
através da moldura de uma janela é a paisagem que se organiza o melhor possível
para gozo do meu olhar; pela frecha de uma porta vejo o tal obscuro
objecto do desejo. no dia-a-dia são estes os dois tipos de enquadramento
impostos pela realidade, que decide literalmente o que vemos; no cinema, por
exemplo, a realidade cede a direcção das imagens ao realizador, e é então ele que
escolhe o que vemos e o que não vemos, o que vemos através de, e o que podemos imaginar. as ditaduras do olhar estão
por todo o lado, resta a liberdade para decidir com qual nos identificamos
mais. que filme vou ver hoje? de que bom ditador?
Cet Obscur Objet du Désir, Luis Buñuel
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