quarta-feira, 2 de julho de 2014

preces

há alturas na vida (e começar dizendo “há alturas na vida”, eu sei, é uma banalidade) em que  precisamos de nos libertar do sagrado. o sagrado não é uma cruz ao peito ou uma missa de Bach. podia ser. o sagrado é uma memória. uma memória que colocamos em causa, tal como os crentes, nos momentos de maior sofrimento, colocam em dúvida a existência de deus. olho para uma camisa antes de a depositar no tambor da máquina de lavar, e pergunto “estavas mesmo no meu corpo naquele dia?”. espero ansiosamente  um “não” que me conforte e devolva outra fé; encontro-me em genuflexão diante de um altar imaginário. mas as minhas preces são ignoradas: o “sim” insinua-se na cor da camisa e oferece um bilhete de volta a essa memória.


(memórias sagradas são puras ficções.)


An Affair to Remember, Leo McCarey

1 comentário:

  1. [sagrado, sagrada - que exactidão?

    para uns a subtil terminologia, a correcção técnica, um murmúrio;
    para uns outros a diurna e incorrecta tradução
    a frequência cardíaca da palavra,

    o próprio coração?...]

    um imenso abraço,

    bL

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